sábado, 22 de outubro de 2011

Bem Haja a Democracia

Poderia começar este artigo como habitualmente, com um enchorrilhado de chalaças fáceis para aquecer os leitores e forçar os primeiros sorrisos, mas não o vou fazer.

Isto porque a situação económica do país é tão depressiva neste momento que esse tipo de piadas, face ao sentimento generalizado de desespero que se impôs no seio da população, jamais resultaria.

(Estou a falar bem e bonito, coisa rara, deixa aproveitar)

Há dias escrevi no facebook que a Democracia estava sobre-valorizada.

Depois de muita ponderação decido aqui, perante vós, retratar-me.

Estava completamente errado e quando assim é o profeta também possui a capacidade de assumir que errou. Para isso enunciarei os processos mentais que me levaram a mudar de opinião e concluir que de facto a Democracia não está sobre-valorizada e que deve ser estimada e celebrada por todos.

Mas primeiro permitam-me deixar no ar a ideia do que impulsionou a revolução de 74.

Ao contrário do que se pensa e se diz e se ouve em documentários o principal motivo que levou à revolução foi a inexistência da Zon ou Meo nesses tempos. Aliás a existência de uma Sic ou uma Tvi poderia muito bem ter prevenido a revolução. Um sem numero de novelas e reality-shows seriam o suficiente para manter o povo entretido. Claro que com apenas 2 canais seria difícil evitar o sucedido.

Mas continuemos.

Um dos primeiros motivos que me levou a pôr em causa a minha afirmação foi a realidade empresarial na era pré-democrática. Nessa altura como todos sabem as pequenas e médias empresas não tinham hipótese de sobrevivência num mercado monopolizado pelas super-potências. Qualquer negócio que não tivesse ligações e algum tipo de influencias politicas não singrava. Era do conhecimento geral que existiam concertações de preços entre as grandes empresas sem que a população o pudesse evitar.

Felizmente com a chegada da democracia as PME’s puderam finalmente impor-se e arranjar o seu espaço, os negócios familiares começaram a florescer e a prosperar. As pequenas empresas conseguiram finalmente jogar em pé de igualdade com as grandes e basta percorrer as ruas mais comerciais para se perceber que o negócio cresce a bom ritmo e nada faz prever que tal crescimento pare.

O segundo ponto em que me foquei foi na disponibilização de serviços básicos em todo o território nacional. Antigamente fecharam-se escolas e hospitais por esse país fora obrigando as populações a percorrer quilómetros para terem acesso a ensino e saúde. Felizmente com a chegada da democracia e da prosperidade económica hoje em dia temos praticamente uma escola e um hospital em cada virar de esquina e as pessoas do interior não ficaram esquecidas e privadas de tais serviços.

O terceiro ponto é também ele fundamental e baseia-se na estruturação da sociedade em classes. Antes de Abril de 74 é do conhecimento geral que a sociedade se dividia entre uma percentagem mínima de pessoas muito ricas, uma grande maioria de pessoas com fracos rendimentos e uma classe média que se ia reduzindo ao longo do tempo. Felizmente a revolução trouxe um sistema de classes mais adequado com proporções iguais entre os estratos sociais onde qualquer individuo tem a oportunidade de ser bem sucedido financeiramente se assim o desejar e em que o estrato mais pobre da sociedade se encontra em extinção e cada vez mais se vai transformando em classe média. A maior parte dos ricos são-no por mérito próprio e não através da exploração de mão de obra barata, de acumulação de cargos privados e públicos/políticos ou de fugas ao fisco.

Foquei-me também no factor segurança. Onde casos mediáticos caíram facilmente no esquecimento, muitos deles envolvendo indivíduos ligados ao regime. Casos esses que foram abafados e sem que chegassem a existir condenações. Altas entidades eram livres de cometer as maiores barbaridades envolvendo má gestão que levava ao declínio económico sem que fossem responsabilizados por tal. Também os pequenos criminosos eram livres de roubar, matar, violar ficando muitos deles em liberdade com penas suspensas. Hoje em dia tal seria impensável.

Lideres políticos? Muitos deles desviaram fundos públicos, sacos azuis e um sem numero de crimes de colarinho branco sem nunca serem condenados e muitos deles livres de se recandidatarem. Lembro-me de ler em livros de historia casos como o de Fátima Felgueiras em 68 e Avelino Ferreira Torres em 72. Muito grave. Mais uma vez graças à democracia tudo isso acabou.


Por fim um dos temas que mais polémica levanta. A censura. Um dos aspectos centrais que levaram à revolução. Antigamente até jogadas de bastidores em canais privados de televisão existiram graças ao longo tentáculo do regime. Casos mediáticos abafados da comunicação social, irregularidades esquecidas, um sem numero de casos que nunca vieram a publico devido aos entraves e influencias politicas de que os meios de comunicação eram alvo.

Por tudo isto conseguem agora perceber a necessidade de me retratar. A Democracia feita da maneira correcta como o é hoje em dia é de facto preciosa. Devemos estimar e agradecer a dádiva que é vivermos em democracia.

Depois de tudo isto, ainda acham descabida a ideia de que só existiu revolução porque não havia nada na televisão para entreter o povo?

Beijinhos gostosos a todos.

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